terça-feira, 8 de novembro de 2011

Aos Companheiros de Ofĩcio

"O poema brota do espanto" (Ferreira Gullar). Diante do homem o retábulo da vida, a tela barroca dos instantes e o vazio. Como nos ensinou o grande poeta: deixemos em paz nossa cidade, suas ruelas, seu casario, sua gente, deixemos no torpor das horas o corpo que se adensa, a vontade desatinada, a música de cada dia na fábrica do cotidiano, deixemos os homens e as crianças girando nestas rotas de sempre, nos trajetos corriqueiros, na fugacidade dos passos sobre as pedras, esqueçamos o rio, a ponte e toda água que transcenda as margens ,deixemos o sentimento, o incansável sentimento do mundo e nossas mãos rotas...
cala-te
e procura neste silêncio a eloquência do infinito, revisitando a memória, perscruta toda fuga, prova toda loucura, alcança o impensável, instaura o intangível, transgride o sacro e brando, então, quando as fronteiras tiverem ruído e alargados os horizontes, abre teus olhos e afia tua voz, pois terás diante de ti o retábulo da vida, a tela barroca dos instantes e o vazio, e sentirás que a poesia é da busca, não importando se encontrarás no fim (mesmo se houvesse um fim) aquilo que não se limita, alcança, abraça, que nossas tão poucas duas mãos não afagam mas como algo dentro de nós, lá onde não se divisa carne, osso e matéria etérea, no cerne, no caroço do corpo reside e prova o que fica. Para que serve o amor? a amizade? a poesia? me faço tais perguntas como um dia fez um grande poeta, e como ele não as respondo, sei do quanto é inútil a certeza nessas horas, sei apenas o não saber do fim, mesmo assim te proponho a procura: uma das faces da poesia. um dos sentidos da vida. e a razão de nosso ofício.
"Do espanto nasce o poema" (Ferreira Gullar)
05/11/2011 em Igarassu