quinta-feira, 4 de abril de 2013

"A monarquia vai voltar pro Brasil"

     Também me espantei com essa declaração quando pus os pés hoje no terminal da macaxeira. Uma senhora muito bem vestida, com postura e impostação vocal dignas de um arauto da família real vomitava aos quatro cantos mal projetados daquele lugar de suplício a mais nova e absurda profecia de terminal. Para os bem-aventurados que não precisam passar todos os dias pelos purgatórios que eufemicamente chamamos de integrações fica difícil explicar a tortura que é além de esmagado, ofuscado, violentado pelos outros, ser alvo das pregações messiânicas desses seres sacrossantos que chamo carinhosamente de profetas de terminal tão solícitos em nos apontar os caminhos mais largos para as chamas e o ranger de dentes enquanto esperamos nossos cubículos sobre rodas. Tenho ainda mais dificuldade de explicar o esforço imenso que fiz para não cair numa crise de riso irreversível quando tomei conhecimento de uma notícia tão importante para nossa identidade nacional. Depois do primeiro choque tentei construir linhas de raciocínio que me apontassem a sanidade mental da digníssima senhora (eu sinceramente simpatizei com aquele rosto que parecia conter alguma bondade) ela poderia estar usando o discurso figurativo para anunciar o reinado de Cristo (o que não deixaria de me assustar por que não consigo imaginar a figura de Cristo junto ao que a maioria das monarquias representou ao longo dos séculos) ocorre que ela resolve explicar mais e dizer que teremos um rei assim como Dom Pedro I o que levou definitivamente minhas esperanças de que tudo não passasse de um lance de oratória para atrair a atenção do povo. Também não posso deixar de observar que até aqui temos uma profetisa diferenciada, nada de versículos soltos falando de maldições e castigos, nada de avisos sobre dias e horários do julgamento final, nada de acusações cuspidas nos rostos de quem se arrasta nas filas, parecia realmente se tratar de uma enviada especial de alguma corte obscura talvez escondida em algum bairro nobre de nossas metrópoles apenas esperando o momento mais dramático para dar seu golpe de estado restaurando democraticamente pela vontade do rei um regime que fora soterrado por um século de avanços ( e muitos retrocessos, claro) e uma humanidade que mal engoliu e hoje talvez só tolere por puro folclore as monarquias de vitrine que ainda resistem em alguns locais do mundo os quais prefiro não referir por uma questão de respeito a quem simpatiza com velhinhas bonachonas usando coroas e cetros de ouro...
         Por fim o momento mais aterrador foi quando ela revelou que fora enviada por Deus para anunciar a nova (que está muito longe de ser boa e deixo bem claro o misto de tristeza e revolta diante de desvios tragicômicos como o dessa iluminada pela ignorância). A partir daí percebi a inutilidade de perguntar se teríamos uma monarquia parlamentarista. Com certeza uma legitimação tão incontestável não deixa margem para duvidar que nos salões do palácio do planalto se ouvirá por muitas gerações o toc-toc de sapatos à la Luis XIV.